Escrevi um poema chamado "Antonioni" há uns cinco anos. Acabei esquecendo-me dele, porque, digamos, envelheceu mal. Falava sobre uma incapacidade de seguir as causas e efeitos da realidade, justamente porque, numa realidade um tanto quanto "virtual", só sobrariam pausas, fotogramas de realidade, pixels de verdade. No final, ficou algo mais a ver com Mário Peixoto do que com Antonioni. Não é grande coisa, mas vá lá, ressucitá-lo-ei. Rest in peace, Antonioni.
Antonioni
e são só pausas
todo este momento
pausas no futuro inacabado.
a mochila nas costas.
as aves.
a montanha.
pausas incríveis.
o trabalho volta a consumir.
a música se (e re) integra.
e os jogos: todos valendo dinheiro.
todos pausas espetaculares.
comandando aquele exército de neurônios.
ludibriando este curso sonolento.
as pausas que nos distraem;
nos fazem decidir, desviar o olhar.
nos submergem num doce líquido azulado.
claro e límpido: muitos sorrisos conquistados.
a dor por dentro cessa até brotar novamente.
vivem todos drogados, eles.
provocam, interrompem, retornam ao confortável conhecido.
por um momento, deixei que continuasse.
preferi sofrer o calor que me provoca coragem.
o curso verdadeiro, incolor e condensado:
não quero mais pausas no tempo.
4 comentários:
Muito bom!
Admiradora silenciosa...
Fantástico! Adoro ler as coisas que vc escreve!!!
Um grande abraço
Gabi (namorada do Marcos):)
outro dia tava revendo "depois daquele beijo"...vc que me deu esse dvd! adoro tudo naquele filme! Da linguagem as roupas!
rest in peace, antonioni...
Dentro de ti
neblinas se rasgaram
como compreensões
geradas de catástrofes
como as pálidas tiras de luz
que após os ventos em síncope
se deixam às praias
pelo olhar líquido e amainado,
transmudando
o que tardiamente
rolaram como inútil.
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