sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Crepúsculo do Cinema

Pois é, Bergman e Antonioni faleceram esses dias e toda uma imensa comunidade de cinéfilos parou para pensar um pouco o que significou, para a chamada sétima arte, o adeus desses dois caras. Não vou ficar aqui teorizando a respeito da obra de ambos ou tentar imaginar o que eles ainda poderiam contribuir para a restauração de uma arte em decaimento. A única ressalva é pensar justamente o quanto ambos significaram para um cinema sem limitações, em que o criador tem posse de sua obra, e aval para prosseguir investigando as possibilidades da arte, da filosofia e da imagem utilizando a liberdade estética como um leitmotiv sem fronteiras. Não deixaram herdeiros, ambos, provando que até mesmo a arte, como manifestação coletiva, tem também sua pulsão tanática.

Escrevi um poema chamado "Antonioni" há uns cinco anos. Acabei esquecendo-me dele, porque, digamos, envelheceu mal. Falava sobre uma incapacidade de seguir as causas e efeitos da realidade, justamente porque, numa realidade um tanto quanto "virtual", só sobrariam pausas, fotogramas de realidade, pixels de verdade. No final, ficou algo mais a ver com Mário Peixoto do que com Antonioni. Não é grande coisa, mas vá lá, ressucitá-lo-ei. Rest in peace, Antonioni.

Antonioni

...

e são só pausas

todo este momento­

pausas no futuro inacabado.

a mochila nas costas.

as aves.

a montanha.

pausas incríveis.

o trabalho volta a consumir.

a música se (e re) integra.

e os jogos: todos valendo dinheiro.

todos pausas espetaculares.

comandando aquele exército de neurônios.

ludibriando este curso sonolento.

as pausas que nos distraem;

nos fazem decidir, desviar o olhar.

nos submergem num doce líquido azulado.

claro e límpido: muitos sorrisos conquistados.

a dor por dentro cessa até brotar novamente.

vivem todos drogados, eles.

provocam, interrompem, retornam ao confortável conhecido.

por um momento, deixei que continuasse.

preferi sofrer o calor que me provoca coragem.

o curso verdadeiro, incolor e condensado:

não quero mais pausas no tempo.